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13.7.11

Controlandos brinquedos com microcontroladores PIC

Controlando brinquedos com microcontroladores PIC

Defferson Rodrigues Martins das Neves
deffersonr@yahoo.com.br

Utilizar os princípios da engenharia reversa é uma ótima maneira de descobrir como dispositivos, máquinas e equipamentos, eletrônicos ou não, funcionam. O objetivo do artigo que aqui se inicia é, através da desmontagem e análise das partes de um brinquedo eletrônico, conhecer os componentes, e o funcionamento do circuito de controle do mesmo e assim modificar seu funcionamento.

A técnica de “engenharia reversa” é ampla e mundialmente difundida no meio da pesquisa, projeto e desenvolvimento de produtos. Todos os tipos de indústrias alguma vez já se utilizaram de seus benefícios. O termo “engenharia reversa” se reveste de um complexo significado, mas basicamente podemos dizer que, a engenharia reversa consiste em desmontar uma máquina para descobrir como ela funciona. É bem provável que nossos leitores tenham iniciado seus “estudos” na área da eletrônica justamente com a engenharia reversa. Quem nunca desmontou um carrinho, um robô de brinquedo, um “liquidificadorzinho”, um radinho de pilhas, ou coisas parecidas, simplesmente pelo prazer de ver como funcionam, ou então retirar um “motorzinho” ou aquele alto-falante? Quem poderia imaginar que nesse momento estava realizando não mais que, a tal “engenharia reversa”?

A técnica da engenharia reversa é muito poderosa, aliada a consulta a bons livros, anotações, informações da internet e datasheets, pode elevar o nível de conhecimento a altos patamares.

Vamos propor nesse artigo a desmontagem de um carrinho de controle remoto, descobrir o seu funcionamento e inserir inteligência ao mesmo, através de um microcontrolador PIC previamente programado.

“Como observação destacamos que o trabalho que iremos iniciar fará uso de microcontroladores e sua programação, não vamos nos ater às técnicas de gravação ou ao funcionamento dos mesmos, presume-se que os leitores que se proponham a desenvolver as seguintes tarefas tenham conhecimento suficiente em gravação e funcionamento dos PICs, porém para os que ainda não chegaram lá as revistas da editora Saber (Eletrônica Total, Saber Eletrônica e Mecatrônica Fácil) já publicaram diversos artigos que satisfazem esse objetivo, recomendamos que o leitor entre em contato com o marketing da revista para verificar quais números adquirir.”

Nesse ponto podemos expor um objetivo secundário do artigo, que é oferecer mais uma opção aos interessados em montar dispositivos microcontrolados, mas que não possuem intimidade suficiente com montagens mecânicas, o artigo demonstrará que é possível utilizar em seus projetos, partes que já estejam montadas, agregando a elas a eletrônica conseguindo assim um excelente resultado final.

Pois bem, sigamos adiante. O carrinho utilizado em nossa engenharia reversa será o da figura 1, não há nada de especial nele, é um carrinho de controle remoto comum, adquirido em um bazar beneficente, por um ótimo preço porém, sem o controle remoto. Você verá no decorrer do artigo que a maioria dos carrinhos de controle remoto existentes no mercado nacional atenderá nossas necessidades.




Figura 1 – carrinho de controle remoto comum

O primeiro passo será desmontar o carrinho (figura 2), de forma que possamos ter acesso a placa de circuito impresso com os componentes conforme a figura 3.




Figura 2 – desmontando o carrinho




Figura 3 – Placa de circuito de controle do carrinho

Com o acesso a parte interna do carrinho já podemos iniciar o processo de análise do circuito e do funcionamento mecânico. De imediato podemos verificar que existem dois motores no interior do compartimento, um que faz o carrinho andar para frente e para trás e outro que faz as rodas da frente virar para a direita e para a esquerda. Seguindo os fios que estão conectados nos dois motores descobriremos que eles estão ligados à placa de circuito impresso, e estudando um pouco a placa identificaremos que os motores estão na verdade, conectados, a duas pontes H, formadas por transistores. O motor de direção, está conectado a transistores de baixa potência do tipo BC548/558, já o motor de tração, que movimenta o carrinho para trás e para frente está conectado a transistores de média potência como os do tipo BD135/136. Essas informações já nos revelam muita coisa sobre o funcionamento, já sabemos que ambos os motores são ligados a pontes H, que é uma forma muito comum de controlar motores de corrente contínua, como é do conhecimento de muitos de nossos leitores (figura 4).




Figura 4 – 4 transistores de média potência formando uma ponte H e mais 4 de pequena potência ao fundo

Para os que não sabem o que é uma ponte H, ou como funcionam, as revistas da editora Saber já publicou vários artigos relacionados ao assunto e o livro Eletrônica Básica para a Mecatrônica, da mesma editora, traz um capítulo completo a respeito. Essas configurações são encontradas na grande maioria dos carrinhos a controle remoto.

Continuando nossa análise do circuito, encontraremos na placa o circuito integrado RX2C (figura 5).




Figura 5 - CI RX2 – controle remoto com 5 funções


Com uma rápida busca em sites de datasheets, descobriremos que existe um par de circuitos integrados - RX2/TX2 - que funcionam de forma complementar (figura 6), um gerando sinais através de comandos de entrada, e o outro decodificando esses sinais e transformando em comandos de saída.




Figura 6 – funcionamento do par de CIs TX2/RX2

Após uma bela “olhada” no datasheet dos componentes, o que podemos concluir? Que o TX2 funciona do seguinte modo, um pulso negativo (verifique no datasheet) em um dos pinos 1, 4, 5, 6 ou 14, fará com que na saída, pino 8, apareça um trem de pulsos correspondente. Já o RX2, que é o que nos interessa, funciona de maneira exatamente inversa, recebe um trem de pulsos em sua entrada, pino 3, e aciona a saída correspondente a esse trem de pulsos, pinos 6, 7, 10, 11 ou 12 (direita, esquerda, para trás, para frente e turbo, respectivamente). Estes CIs são utilizados em praticamente todos os brinquedos que utilizam a configuração de controle remoto comum e o datasheet dos componentes apresenta propostas de implementações interessantes, realizando as conexões entre ambos os componentes via RF, IR ou cabo.

Levantamos então mais uma importantíssima informação, já sabemos qual pino do RX2 controla qual função do nosso carrinho, isso significa que, se retirarmos o CI do circuito o substituirmos por um novo componente que forneça os sinais nos pinos correspondentes poderemos controlar nosso carrinho de uma forma diferente da prevista inicialmente, vamos então para a parte seguinte da nossa engenharia reversa, substituir o RX2 por um microcontrolador PIC e programar o mesmo para que o carrinho faça exatamente aquilo que quisermos, adicionando assim “inteligência” em nosso brinquedo.

O carrinho possui ainda a etapa de radiofrequência, que recebe o sinal de rádio do controle remoto, amplifica esse sinal e oferece ao CI RX2, porém para nosso projeto não nos interessa no momento.

Nosso microcontrolador PIC, terá uma tarefa simples, gerar os sinais necessários para que o carrinho se mova para trás, para frente e faça curvas sem a necessidade do controle remoto. Para isso iremos utilizar um programa (listado ao fim do artigo ou que poderá ser baixado no site da revista (os editores da revista deverão decidir sobre isso)), que faz simplesmente isso, aciona os pinos do PORTB do PIC 16F84, de forma que cada um dos 4 bits menos significativos do PORTB seja responsável por um comando (nosso carrinho não possuía o comando turbo). O programa está bem comentado, explicando o que cada instrução ou bloco realiza, o mesmo pode ser alterado para que o carro execute qualquer manobra, no entanto o leitor deve ficar atento para não “setar”, ou seja, não colocar o valor “1” nos bits que correspondam a, para trás e para frente ou direita e esquerda, ao mesmo tempo, isso fará com que o carrinho não execute nenhuma ação e poderá inclusive curto circuitar os transistores da ponte H, danificando os mesmos.

Montaremos o circuito da figura 7, que é o circuito mais simples para fazer um PIC funcionar, a montagem desse circuito foi realizada em uma placa de circuito impresso universal (figura 8), mas nada impede que os leitores mais experientes confeccionem suas próprias placas, sempre atentando que o ideal para o microcontrolador é que seja utilizado um soquete, já que o mesmo será retirado do circuito por diversas vezes para gravação.




Figura 7 – diagrama esquemático do circuito de controle microcontrolador




Figura 8 – circuito de controle microcontrolado montado em uma placa universal

Essa placa será fixada no carrinho da maneira que o leitor ache melhor. O circuito será alimentado pelos 6V provenientes das 4 pilhas do carrinho, por isso foi acrescentado um diodo 1N4001 em série com a fonte para que haja uma queda de 0,7 volts no diodo, e o PIC seja alimentado com aproximadamente 5,3V. Dos pinos do PORTB0, PORTB1, PORTB2 e PORTB3 do PIC saem fios que são ligados respectivamente onde estavam os pinos 6, 7, 10 e 11 do RX2 que foi retirado da placa (figura 9), são esses os fios que levarão os sinais gerados pelo PIC para a placa de controle do carrinho, substituindo assim o CI RX2.




Figura 9 – fios que vem da placa do microcontrolador soldados onde anteriormente estava o CI RX2

Na figura 10, pode-se verificar o resultado final da montagem, lembrando que o leitor poderá decidir a melhor forma de fixar a placa com o PIC no carrinho. Caso você queira verificar o carrinho em funcionamento acesse os links http://www.youtube.com/watch?v=vnNTt4CaOvk ou http://www.youtube.com/watch?v=uV3YpmEpNEc, você verá o carrinho se movendo com o programa que foi fornecido gravado no PIC, altere da forma que quiser.




Figura 10 – resultado final

Nossa engenharia reversa está terminada, os objetivos foram alcançados, descobrimos como funciona mecânica e eletricamente um carrinho a controle remoto, aprendemos como funciona os CIs mais comuns utilizados nesses brinquedos e ainda dotamos nosso brinquedo de “inteligência” através de um microcontrolador PIC. Esse é sem dúvida um excelente método para aprender mais, não só sobre eletrônica, mas também sobre uma infinidade de coisas, utilizem-se dele sempre que possível, boas experiências a todos e até a próxima.

Bibliografia

SOUZA, D. J. Desbravando o PIC. 4ª ed. São Paulo: Érica , 2000.

MARTINS, N. A. Sistemas Microcontrolados – uma abordagem com o microcontrolador PIC 16f84. 1ª ed. São Paulo: Érica, 2005.

BRAGA, N. C. Eletrônica Básica para a Mecatrônica. 1ª ed. São Paulo: Saber, 2005.